BENJAMIN BRECKINRIDGE WARFIELD (1851-1921) estudou
no Princeton Coliege, no Seminário da Princeton e na Universidade de Leipzig,
na Alemanha. Warfield, ordenado em 1879, lecionou no Seminário Teológico
Ocidental, Allegheny, PA, de 1878 a 1887, quando foi para o Seminário da
Princeton, onde permaneceu até sua morte, em 1921. Foi seguidor do Dr. A. A.
Hodge e manteve a posição conservadora calvinista desse grande teólogo,
Calvino, De 1890 a 1902, editou a Presbyteriam and Re[ormed Review. Muitos de seus
livros ainda são lidos hoje em dia, incluindo Biblical and Theological Studies
[Estudos Bíblicos e Teológicos], Calvin and Angustine [Calvino e Agostinho],
Inspiration and Authority of lhe Bible [Inspiração e Autoridade da Bíblia], The
Person and Work of Christ [A Pessoa e a Obra de Crista],
A DIVINDADE DE
CRISTO
Um homem
ao ver o rosto de seu amigo o reconhece, como reconhece sua própria letra
quando se depara com ela. Pergunte-lhe como ele sabe que esse rosto é o de seu
amigo, ou que essa letra é a sua, e ele pode emudecer ou, se procurar
responder, balbuciar algo sem sentido.
Não
precisamos aguardar para analisar as bases de nossas convicções antes que elas
operem para produzir convicções, assim como não necessitamos aguardar para
analisar nossa comida antes que ela nos nutra.
O
testemunho na solução
Os textos
particulares, nos quais a divindade de Cristo é afirmada, não são as provas mais impressionantes que as
Escrituras fornecem da divindade de nosso Senhor. Pode se comparar esses textos
aos cristais de sal que aparecem na areia da praia depois que a maré recua.
"Esses cristais de sal não são", observa ele, "a prova mais
forte, embora seja a mais aparente, de que o mar é salgado; o sal está presente
na solução de cada balde de água do mar".
A divindade
de Cristo está na solução de cada página do Novo Testamento. Cada palavra acerca Dele, cada palavra proferida a respeito Dele,
pressupõe a aceitação de que Ele é Deus. Essa é a razão pela qual a "crítica", que procura eliminar o
testemunho do Novo Testamento em relação à divindade de nosso Senhor, impôs a
si mesma uma tarefa sem esperança. O Novo Testamento teria de ser eliminado. Não podemos nos afastar de
seu testemunho. Como a divindade de Cristo é a pressuposição de cada palavra do
Novo Testamento, fica impossível selecionar palavras do Novo Testamento e
buscar, com elas, construir documentos mais recentes nos quais a divindade de
Cristo não seja afirmada. A convicção segura da divindade de Cristo é
contemporânea ao próprio cristianismo. Jamais houve um cristianismo, nem nos
tempos dos apóstolos, que não afirmasse com toda a sua força que Jesus é Deus em toda a sua plenitude. Jesus e Jeová são um só Deus.
Um
evangelho saturado
Observemos,
por meio de um ou dois exemplos, quão completamente saturado está a narrativa
do evangelho com a aceitação da divindade de Cristo, de maneira que ela surge
de forma e em lugares inesperados.
Em três passagens de Mateus,
relatando as palavras de Jesus, Ele fala de modo familiar e da maneira mais
natural do mundo sobre "seus anjos" (13.41; 16.27; 24.31). “Mandará o Filho do homem os seus anjos, e eles
colherão do seu reino tudo o que causa escândalo, e os que cometem
iniqüidade”.Mateus 13:41
“Porque
o Filho do homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos; e então
dará a cada um segundo as suas obras.”Mateus 16:27
“E
ele enviará os seus anjos com rijo clamor de trombeta, os quais
ajuntarão os seus escolhidos desde os quatro ventos, de uma à outra
extremidade dos céus.”Mateus 24:31
Em todas
elas, Ele afirma que é o "Filho do Homem"; e em todas as três existem
sugestões adicionais de sua majestade. "Mandará o Filho do Homem os seus
anjos, que ajuntarão do seu reino todos os escândalos e os que praticam
a iniqüidade e os lançarão na fornalha acesa; ali haverá choro e ranger de
dentes" (Mt 13.41,42).
Quem é esse
Filho do Homem que tem anjos, por cuja instrumentalidade o juízo se executará a
seu comando? "Porque o Filho do Homem há de
vir na glória de seu Pai, com os seus anjos, e, então, retribuirá a cada um
conforme as suas obras" (Mt 16.27). Quem é este
Filho do Homem cercado por Seus anjos e em cujas mãos estão a distribuição da
vida? O Filho do Homem "enviará os
seus anjos, com grande clangor de trombeta, os quais reunirão os seus
escolhidos, dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus" (Mt
24.31). Quem é este Filho do Homem que, por sua
ordem, Seus anjos selecionam os homens? Um
escrutínio dessas passagens mostrará que não é um corpo particular de anjos que
significa os "anjos" do Filho do Homem, mas todos os anjos do céu são
Dele e estão ali para servi-Lo, conforme Ele ordenar. Em uma palavra, Jesus
Cristo está acima dos anjos (Mc 13.32) — como é argumentado de modo extenso e
explícito no início da epístola aos Hebreus. "Ora, a qual dos anjos jamais
disse: Assenta- te à minha direita..." (Hb 1.13).
O céu vem
a terra
Existem
três parábolas relatadas no décimo quinto capítulo de Lucas, como proferidas
por nosso Senhor em Sua defesa contra os murmúrios dos fariseus, que
protestavam quanto ao fato de Ele receber os pecadores e comer com eles. A
essência da defesa que nosso Senhor oferece para Si mesmo é que há alegria no
céu graças aos pecadores que se arrependem! Porque
"no céu", diante do trono de Deus? Ele está apenas pondo o juízo do céu contra o da terra, ou apontando
para sua vingança futura? De forma alguma. Ele está
representando Sua ação de receber os pecadores, de procurar o perdido, como Sua
própria missão, pois esta é a conduta normal do céu que se manifestou Nele. Ele é o céu que vem a terra. Sua
defesa é, portanto, apenas o desvelar a natureza real da transação. Os
perdidos, quando se aproximam Dele, são recebidos, porque este é o caminho do
céu; e Ele não pode agir de outro modo, senão pelo modo do céu. Ele assume
tacitamente a parte do bom Pastor como Sua.
A posição
única
Todas as
grandes designações não são tão afirmadas quanto assumidas por Ele para Si
mesmo. Ele não se autodesigna profeta, embora aceite esta designação de outros. Ele coloca-se acima de todos os profetas, até
mesmo de João, o maior dos profetas, como aquele para quem todos os profetas
olharam. Se chama a Si mesmo de Messias, preenche esse termo dando-lhe um significado mais profundo,
abrigando-se na única relação que há entre o Messias de Deus, como seu
representante, e Seu Filho. Jesus não fica satisfeito em apresentar-se
meramente como alguém que tem uma relação única com Deus. Ele afirma que é o recipiente da plenitude divina, o participante de
tudo que Deus tem (Mt 11.28). Fala livremente de Si mesmo
como o Outro de Deus — a manifestação de Deus sobre a terra, ou
seja, quem quer que 0 visse, via também o Pai — e
Aquele que faz a obra de Deus na terra. Ele afirma,
abertamente, ter prerrogativas divinas — o
conhecer o coração do homem, o perdão dos pecados, o exercício de toda
autoridade no céu e na terra. Na verdade, tudo que Deus tem e é,
Ele afirma ter e ser; onipotência, onisciência, perfeição
pertencem tanto a um como ao outro. Ele não
somente executa os atos divinos, mas Sua própria consciência se adere à
consciência divina.
A prova
maior
As
Escrituras nos dão evidência suficiente, portanto, de que Cristo é Deus.
Contudo, elas estão longe de nos conceder toda a evidência que temos. Há, por
exemplo, a revolução que Cristo operou no mundo. Se, na verdade, se perguntasse
qual é a prova mais convincente da divindade de Cristo, talvez a melhor
resposta fosse o cristianismo. A nova vida que ele trouxe ao mundo; a nova
criação que ele produziu por meio de Sua vida e obra no mundo; aqui estão pelo
menos as credenciais mais palpáveis.
Olhemos
para isso de forma objetiva. Leia-se o relato histórico do avanço e das
conquistas do cristianismo nos dias da igreja primitiva e, depois, pergunte-se:
Poderiam essas coisas ter sido forjadas
por um poder menor do que o divino? E, a
seguir, lembre- se que essas coisas não apenas foram forjadas naquele mundo
pagão dois mil anos atrás, mas foram forjadas novamente em cada nova geração,
pois o cristianismo reconquista o mundo para si, geração após geração. Pense em
como a proclamação cristã se disseminou, perfazendo seu caminho sobre o mundo
como o fogo na grama seca de uma campina. Imagine como ele, enquanto se
dissemina, transformou vidas. Isso, quer em seu aspecto objetivo, quer em seu
aspecto subjetivo, se fosse incrível, não teria realmente ocorrido. Poderia esta influência transformadora, que não foi diminuída após dois
milênios, ter provindo de um mero homem?
Historicamente, é impossível que o grande movimento, que chamamos cristianismo
e que não esgota após todos estes anos, pudesse ter se originado de um impulso
meramente humano, ou pudesse representar hoje a obra de uma força meramente
humana.
A prova
interna
Ou olhemos
para isso de forma subjetiva. Todo cristão tem dentro de si a prova do poder
transformador de Cristo e pode repetir o silogismo do homem cego: "Nisto é
de estranhar que vós não saibais donde ele é, e, contudo, me abriu os
olhos" (Jo 9.30). Um arrazoado eloqüente exige o seguinte: "Será que
devemos confiar no toque de nossos dedos, na visão de nosso olhos, na audição
de nosso ouvidos e não confiar em nossa consciência, mais profunda, de nossa
mais elevada natureza — a resposta da consciência, o florescer da alegria
espiritual, o brilho do amor espiritual? Negar que a experiência espiritual
seja tão real quanto a experiência física é desprezar as mais nobres faculdades
de nossa natureza. Isso é dizer que metade de nossa natureza diz a verdade, e
que a outra, profere mentiras. A proposição de que os fatos da esfera
espiritual são menos reais do que os fatos da esfera física contradiz toda
filosofia." O coração transformado dos cristãos alista-se a si mesmo
"na gentil temperança, nos nobres motivos, nas vidas vividas visivelmente
sob o império de grandes aspirações" — essas são as provas sempre
presentes da divindade da Pessoa de quem suas inspirações são retiradas.
A prova
suprema para cada cristão acerca da divindade de seu Senhor é, portanto, sua
própria experiência interna em relação ao poder transformador de seu Senhor sobre o coração e a vida. Como aquele que sente o calor
do sol sabe que o sol existe, assim também aquele que experimentou o poder
recriador do Senhor sabe que Ele é seu Senhor e Deus. Aqui está a prova, talvez
possamos dizer a mais apropriada, ou, certamente, devemos dizer a mais
convincente, para todo cristão da divindade de Cristo; uma prova que não pode
escapar, e à qual, seja ele capaz de analisá-la, seja ele capaz de delineá-la
em uma afirmação lógica ou não, ele não pode deixar de dar sua convicção
sincera e irrefutável. Qualquer outro fato ele pode, ou não, ter certeza, mas
ele sabe que seu Redentor vive. Porque Ele vive, nós também devemos viver —
esta era a afirmação do Senhor. Porque vivemos, ele também vive — esta é a
convicção que não pode ser arrancada do coração do cristão.
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