O Segredo
Espiritual de Hudson Taylor
Hudson Taylor não foi nenhum
enclausurado. Ao contrário, foi pai de família, homem que exerceu grande
influência e que assumiu pesadas responsabilidades.
Era de pequena estatura, sem
grandes energias; portanto, tinha de levar sempre em conta limitações físicas.
Tornou-se um homem de grande atividade e médico eficiente; tanto sabia cuidar
de um nenê como preparar uma refeição ou escriturar despesas e consolar doentes
e aflitos; com a mesma segurança com que se lançava a grandes empreendimentos,
sabia também proporcionar uma tão segura liderança espiritual aos homens e
mulheres que o auxiliavam, que isso viria a repercutir em todo o mundo.
Acima de
tudo, soube pôr à prova as promessas de Deus, provando também, ser possível
viver-se uma vida espiritual íntegra no mais alto nível.
Foi, em
grande parte, devido a este homem que o interior da China se abriu para o
Evangelho. Dezenas de milhares de almas foram ganhas para Cristo em muitas
províncias onde, até então, não tinham sequer conhecido um missionário. Cerca
de mil e duzentos homens e mulheres trabalhavam em sua Missão, dependendo tão
somente de Deus para suprir todas as suas necessidades, pois viviam sem
compromisso de salário fixo. A Missão, que nunca solicitou auxílio financeiro,
mas que também nunca ficou endividada, nem jamais recrutou publicamente homens
e mulheres para que viessem a engajar-se em suas fileiras, essa mesma Missão
enviou para os campos de trabalho, de uma só vez, duzentos novos obreiros que
haviam sido recebidos como resposta de orações. Tudo isso constitui o desafio
que nos convida a imitar a fé e a devoção de Hudson Taylor.
Alguém pode perguntar: “Qual o segredo de uma vida assim?” Certamente, Hudson
Taylor possuía um segredo: o hábito simples e constante de buscar o suprimento
da mais simples a mais complexa de suas necessidades,na “inesgotável fonte de
riquezas de Cristo”.
Mas não foi sempre que Hudson Taylor agiu dessa maneira. De fato, passou
por muita angústia espiritual e inquietação interior antes de receber a
revelação que mudaria toda a sua vida. A mudança foi tão marcante e duradoura
(pelo resto de sua vida) que pareceu uma segunda conversão. Vejamos a descrição
desta experiência em suas próprias palavras, registradas em cartas
escritas na época.
“Queria muito poder conversar sobre o caminho da santidade. Tinha uma
inquietação, uma luta infindável para achar o modo de manter continuamente
aquela comunhão e companhia com Deus que às vezes era tão real, porém mais
freqüentemente era tão utópica, tão distante da realidade!
“Mas, sabe, agora acho que essa luta, essa esperança de melhores dias
futuros não é o caminho verdadeiro à santidade, à felicidade, à utilidade, mas
sim algo parecido do que li em um trecho de um livro… com o nome de ‘Cristo é
Tudo’. Diz assim:
‘”O Senhor Jesus recebido é o
início da santidade; o Senhor Jesus bem-amado é a santidade em progresso; o
Senhor Jesus com a certeza de que nunca está ausente seria a santidade
completa… É mais santo aquele que tem mais de Cristo dentro de si, e maior
alegria na obra realizada.’
“Quero viver para deixar meu amado
Salvador operar em mim a sua vontade, a minha santificação, pela sua graça.
‘Habitar nele’, não lutar e debater-me, erguer a ele os olhos; confiar nele
para ter poder no presente; …descansar no amor do Salvador onipotente, no gozo
de uma salvação completa ‘de todo pecado’ – isto não é novo, mas é novo para
mim.Sinto como se o raiar de um glorioso dia viesse sobre mim. Saúdo-o com
tremor, embora com confiança. Pareço ter chegado até a margem somente; porém, é
a beira de um mar sem limites; só provei uma gota, mas de algo que satisfaz
completamente. Cristo é literalmente tudo para mim, agora; o poder, o único
poder para o serviço, o único fundamento para a alegria inalterável…
“Então, como fazer para que a fé
cresça? É só pensar em tudo que Jesus é e em tudo o que ele é para nós: sua
vida, sua morte, sua obra, sua pessoa revelada a nós na Palavra -para ser
assunto constante de nossa meditação.
Não uma luta para conseguir a fé… e
sim, a contemplação daquele que é fiel – parece ser esta a única coisa que nos
é necessária: descansar inteiramente no Bem-Amado, no tempo e na eternidade.”
O testemunho de um
amigo íntimo sobre ele nesta época:
“Ele era agora um homem alegre, um cristão feliz e vivo. Antes havia
sido um cristão compenetrado e laborioso, e ultimamente com pouco descanso de
alma. Agora descansava em Jesus, e deixava que ele fizesse todo o trabalho -o
que fazia toda a diferença. Depois disso, toda vez que pregava o Evangelho, um
novo poder parecia fluir dele, e nas coisas práticas da vida uma nova paz o
possuía. Os problemas não o afligiam como dantes. Lançava tudo sobre Deus de um
modo diferente, e dava mais tempo à oração. Em vez de trabalhar até tarde da
noite, começou a deitar-se mais cedo, e levantar-se às cinco horas para dar
tempo ao estudo bíblico e oração (muitas vezes duas horas) antes que o
movimento do dia tivesse início.”
Uma carta de Hudson
Taylor para sua irmã:
“Quanto ao trabalho – o meu nunca foi tanto, de tamanha responsabilidade
ou dificuldade, mas o peso e a tensão desapareceram. Este último mês (ou mais
de um mês) tem sido, talvez o mais feliz de minha vida, e quero muito
contar-lhe um pouco do que o Senhor fez por minha alma. Não sei até onde
poderei tornar-me claro no assunto, pois nada há de novo, ou estranho, ou
maravilhoso – e ao mesmo tempo está tudo diferente e novo!
“Quem sabe posso explicar se voltar atrás um pouco. Bem, mana, minha
mente labutava muito nestes últimos seis a oito meses, sentindo a necessidade
de maior santidade, vida e poder de alma, para mim e para a Missão. Mas em
primeiro lugar estava minha necessidade pessoal. Senti a ingratidão, o perigo e
o pecado de não viver ainda mais perto de Deus. Orei, agonizei, jejuei,
esforçava-me, tomava decisões, lia a Palavra com maior diligência, procurava
passar mais tempo meditando, mas tudo em vão. Todos os dias, quase hora por
hora, a consciência de pecado me oprimia.
“Bem sabia eu que, se conseguisse permanecer em Cristo, tudo estaria
bem, mas não podia. Começava o dia com oração, resolvido a não tirar de Jesus
os olhos nem por um momento, mas a pressão das obrigações, às vezes muito
difíceis, e as constantes interrupções que tendem a impacientar-nos, faziam com
que eu me esquecesse dele. Também, aqui, o clima age de tal modo sobre os
nervos, que as tentações à irritabilidade, pensamentos duros, e às vezes
palavras ásperas são mais difíceis de se controlar. Cada dia trazia seu
registro de pecado, fracasso, e falta de poder. ‘O querer o bem’ estava ’em
mim’ mas como efetuá-lo, não conseguia descobrir.
“E então veio a pergunta: não haveria salvamento? Teria que ser assim
até o fim – constante conflito, e, muitas vezes, a derrota? Como eu poderia
pregar sinceramente que àqueles que receberam a Jesus, ele ‘deu-lhes o poder de
serem feitos filhos de Deus’ (i.e. semelhantes a Deus) quando não era assim em
minha própria experiência? Em vez de tornar-me mais forte, parecia
enfraquecer-me cada vez mais, e ter menos poder contra o pecado; naturalmente,
pois a fé e até mesmo a esperança fraquejavam. Eu tinha horror a mim mesmo, ao
meu pecado, e todavia não ganhava terreno contra isto. Sentia que eu era filho
de Deus. Seu Espírito clamava em meu coração, apesar de tudo: ‘Aba, Pai’. Mas
eu não tinha força de espécie alguma para erguer-me à altura de exercer meus
privilégios de filho.
“Achei que a santidade, a santidade prática, seria gradativamente
alcançada por meio de um emprego diligente dos meios da graça. Nada havia que
eu desejasse tanto quanto a santidade, nada de que eu tanto necessitasse; mas
longe de alcançá-la mesmo em parte, quanto mais eu a buscava, mais ela fugia do
meu alcance, ao ponto de sentir ameaçada de morte a esperança existente em mim;
e comecei a imaginar se – talvez para tornar mais doce o céu -Deus não o dava
nesta vida. Não acho que eu tentava obtê-la com minhas próprias forças. Sabia
que eu não tinha esse poder. Falei isto ao Senhor, e pedi-lhe assistência e
poder. Às vezes eu quase cria que ele haveria de me guardar e suster; mas,
olhando para trás, ao entardecer – ah! só havia pecados e derrotas para confessar
e chorar diante de Deus.
“Não quero dar a impressão de ter sido esta a única experiência daqueles
longos e exaustivos meses. Mas foi um estado de alma bastante freqüente que
quase terminou em desespero. Entretanto, Cristo nunca me pareceu tão precioso! Um
Salvador que podia e queria salvar este pecador!… E às vezes havia períodos não
só de paz como também de gozo no Senhor; porém duravam pouco, e ainda assim
fazia-se sentir em mim a triste falta de poder. Oh! como o Senhor foi bom em
dar um fim a esse conflito!
“E o tempo todo eu tinha certeza de
que em Cristo havia tudo de que precisava, mas o que eu me perguntava então era
– como obtê-lo? Ele tão rico, e tu tão pobre; ele tão forte, e eu tão fraco.
Bem sabia que havia fartura na raiz e no tronco, mas como fazê-la passar para o
meu raminho desnutrido, era a questão. Fui vendo como que um raio de luz, e
percebi que a fé era o único requisito, a única exigência – o instrumento pelo
qual eu poderia me apossar de sua plenitude, tornando-a minha. Mas eu não tinha
esta fé.
“Lutei para obter fé, mas não a
recebia; tentei exercitá-la, porém em vão. E ao ver mais e mais a maravilhosa
abundância da graça que se deposita em Jesus, a plenitude e perfeição de nosso
precioso Salvador, a minha culpa e incapacidade pareciam aumentar. Os pecados
cometidos pareciam-me insignificantes comparados ao pecado da incredulidade que
causava os outros; que recusava confiar que Deus cumpre a sua Palavra e fazia-o
mentiroso! Eu achava ser a incredulidade o pecado que condena o mundo; e eu o
possuía. Orava por mais fé, e não recebia. O que devia fazer?
“Quando a agonia de alma em que me
encontrava chegou ao auge, uma frase de uma carta escrita por meu querido amigo
McCarthy agiu para remover as escamas de meus olhos, e o Espírito de Deus me
revelou a verdade de nossa união com Jesus como nunca antes a
tinha conhecido. McCarthy, que fora abalado pelo mesmo sentimento de fracasso
que eu, enxergara a luz primeiro e escreveu assim (cito de memória):
“‘Como fazer para que a fé se
fortaleça? Não lutando por ela, mas, sim, descansando sobre aquele que é fiel.’
“E lendo, compreendi perfeitamente!
‘Se somos infiéis, ele permanece fiel.’ Olhei para Jesus e vi (e quando vi, ah,
que gozo senti!) que ele disse: ‘Nunca o deixarei.’
” – Oh! aí está o
descanso! pensei. Lutei em vão para descansar nele. Não lutarei mais. Pois ele
não promete ficar comigo – nunca me deixar, nunca me desamparar? E sabe, mana,
nunca o Senhor há de me deixar.
“Não foi só isto que ele me mostrou;
esta foi uma fração do todo. Enquanto eu pensava na Videira e nas varas, quanta
luz o Espírito bendito derramou em minha alma! Como parecia errado eu querer tirara seiva,
a plenitude dele! Vi então que Jesus não só nunca me deixará, mas que eu sou
membro do seu corpo, da sua carne e de seus ossos. A videira não é só raiz, mas
tudo – raiz, tronco, galhos, raminhos, folhas, flores e frutos. E Jesus não é
só isto – ele é solo e sol, ar e chuva, e dez mil vezes mais do que tudo que já
sonhei, desejei ou precisei. Ah! o gozo de ver esta verdade! Oro para que os
olhos de seu entendimento possam também ser esclarecidos, para que você conheça
e experimente as riquezas a nós concedidas, gratuitamente, em Cristo.
“Ah, minha cara irmã, é uma coisa
esplêndida ser realmente um com o Salvador ressurreto e exaltado, ser
membro de Cristo! Pense no que isto implica. Cristo pode ser rico e eu pobre?
Sua mão direita pode ser rica e a esquerda pobre? Ou sua cabeça bem nutrida
enquanto o corpo morre de fome?…
“A parte mais doce, se é que podemos
dizer que uma parte seja mais doce que a outra, é o descanso que decorre da
plena identificação com Cristo. Agora já não estou mais ansioso sobre coisa
alguma, quando reconheço isto; pois ele, estou certo, é em tudo capaz de
realizar a sua vontade, e sua vontade é a minha. Não importa onde ele me
coloque, nem como. Isto é antes para ele do que para eu considerar; pois no
lugar mais fácil ele tem de dar-me sua graça, e no lugar mais difícil, sua
graça me basta. Para o meu servo, por exemplo, não fará diferença que eu o
mande sair para comprar algumas coisas de pouco valor, ou artigos muito caros.
Em qualquer caso, ele me procurará para eu lhe dar o dinheiro e para me trazer
as compras. Assim, se Deus me coloca em sérias perplexidades, não precisa me
dar muita orientação? Se em posições de grande dificuldade, abundante graça? Em
circunstâncias de fortes pressões e provas, grande força? Não há o perigo de
que os seus recursos sejam insuficientes para qualquer emergência! E os seus
recursos são meus, pois ele é meu, está comigo, habita em mim.
“E desde que Cristo tem assim
habitado, pela fé, no meu coração, como me sinto feliz! Gostaria de poder
falar-lhe, ao invés de estar escrevendo. Não é que eu seja melhor do que fui.
Em certo sentido, não desejo ser, nem estou procurando isso. Mas eu estou morto
e sepultado com Cristo – sim, e ressuscitado também! E agora Cristo vive em
mim, ‘e esse viver que agora tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que
me amou e a si mesmo se entregou por mim.’…
“Agora preciso terminar. Não
disse a metade do que gostaria, nem disse como gostaria, se tivesse mais tempo.
Que Deus lhe dê a apropriação dessas verdades benditas. Não continuemos a
dizer, em efeito: ‘Quem subirá ao céu? (isto é, para trazer do alto a Cristo)’.
Em outras palavras, não consideremos que ele esteja longe, quando Deus nos fez
um com ele, membros de seu próprio corpo. Nem devemos olhar essa experiência,
essas verdades, como sendo para uns poucos. São o direito e patrimônio de todos
os filhos de Deus, e ninguém pode prescindir deles sem estar desonrando o seu
Senhor. Cristo! Ele é o único poder para o livramento do pecado ou para o
serviço verdadeiro.”
Foi uma experiência que resistia às
provas, à medida que os meses e os anos se passavam. Nunca mais voltaram os
dias de insatisfação; nunca mais a alma necessitada viu-se separada da
plenitude de Cristo. Vinham as provações, mais profundas e penetrantes do que
antes (além de muitos outros problemas e lutas, perderia sua esposa e um
filho), mas em todas elas jorrava ininterrupto o gozo da presença do próprio
Senhor. Hudson Taylor havia descoberto o segredo do repouso da alma. Dessa
experiência lhe veio não só uma apreensão mais perfeita do próprio Senhor Jesus
e de tudo o que ele é para nós, como também uma rendição mais completa de si
mesmo -sim, uma entrega total do eu a ele.
Anos mais tarde alguém perguntou para
o Sr. Taylor: “Mas o Sr. está sempre consciente de sua permanência em Cristo?”
Ao que ele respondeu: “Enquanto eu
dormia, na noite passada, será que deixei de permanecer em meu lar por estar
inconsciente do fato? Nunca devemos estar conscientes de não estar
permanentes em Cristo.”
Cerca de vinte anos após esta
experiência marcante, as impressões de um ministro episcopal que o hospedou em
Melbourne (Austrália) são muito interessantes:
“Ele era uma ilustração
objetiva da quietu-de. Tirava da conta bancária celeste o último ceitil da
porção diária daquela promessa: ‘A minha paz vos dou’. O que não podia
perturbar o Salvador nem agitar o seu espírito, também não o devia perturbar. A
serenidade do Senhor Jesus quanto a qualquer assunto, e isso no seu momento
mais crítico, era seu ideal, era o que ele possuía. Desconhecia o alvoroço e a
pressa, os nervos à flor da pele, o espírito de irritação. Sabia que existe a
paz que excede o entendimento e que não podia passar sem ela…
” – Eu estou no escritório,
você no grande quarto de hóspedes, eu disse ao Sr. Taylor, finalmente. Você
está ocupado com milhões, eu com dezenas. Suas cartas são urgentes e
importantes, as minhas insignificantes em comparação. Entretanto, eu sou
preocupado e aflito, enquanto você é sempre calmo. Diga-me o que faz a
diferença.
“- Meu caro MaCartney,
respondeu ele, a paz da qual você fala é, no meu caso, mais que um encantador
privilégio, pois é uma necessidade. Não poderia de maneira nenhuma realizar o
trabalho que realizo sem que a paz de Deus ‘que excede todo o entendimento’
guardasse minha mente e meu coração.
“Foi essa a principal
experiência que tive do Sr.Taylor. Você está apressado, afobado, aflito? Olhe
para cima! Veja o Homem glorificado! Deixe que a face de Jesus brilhe sobre
você – a face maravilhosa do Senhor Jesus Cristo. Ele está preocupado ou
aflito? Nenhum cuidado enruga sua fronte, nenhuma sombra de ansiedade. Contudo,
os assuntos são tanto dele quanto seus…
“Fiquei profundamente
impressionado. Aqui estava um homem de quase sessenta anos de idade, que tinha
sobre os ombros responsabilidades tremendas, e se mantinha, todavia,
absolutamente calmo e despreocupado. Ah, que pilha de cartas! Qualquer uma
delas poderia conter notícia de morte, de falta de dinheiro, de insurreições ou
de sérias dificuldades. Porém, todas eram abertas, lidas e respondidas com a
mesma tranqüilidade – Cristo sendo a razão de sua paz, e poder para sua calma.
Permanecendo em Cristo, ele ia diretamente à sua pessoa, à fonte de recursos,
mesmo enquanto tratava dos problemas. E fazia isto por meio de uma atitude de
confiança simples e contínua.
“Não obstante, era um homem que
encantava pela sua naturalidade e falta de constrangimento. Não encontro
palavras para descrever isso a não ser a expressão bíblica ’em Deus’. Ele
estava em Deus o tempo todo, e Deus nele. Era a verdadeira permanência a que
João, capítulo 15, se refere. E quanto amor atrás disto havia! Ele vivia em
relação a Cristo uma experiência abundante dos Cantares de Salomão. Era uma
ótima combinação – a força e a ternura de alguém que, como o juiz no tribunal,
tem graves responsabilidades, mas leva no coração a luz e o amor de seu lar.”
Um último aspecto importante a
ressaltar é que para Hudson Taylor o segredo da vitória estava na comunhão
diária, de cada momento, com Deus. Ele descobriu que isso só era possível
manter com a oração secreta e o alimento da Palavra pela qual Deus se revela à
alma que espera. Não foi fácil para ele, por causa da vida movimentada que
levava achar tempo para a oração e estudo bíblico, mas ele sabia que era
indispensável. O filho e a nora dele lembram-se de como viajaram com ele
durante vários meses, no norte da China, de carroça e de carrinho de mão,
parando em péssimas pensões à noite. Muitas vezes quando só havia um cômodo
grande para os passageiros e também para os cules que os conduziam, era preciso
fechar com qualquer espécie de cortina um canto para o pai e outro para eles. E
então, quando todos dormiam e havia um relativo silêncio, ouviam alguém riscar
um fósforo e viam o lume incerto de uma vela. Era o Sr.Taylor, não obstante o
cansaço, examinando os textos da pequena Bíblia em dois volumes que sempre
tinha consigo. Das duas às quatro da madrugada era o horário que geralmente
fazia isso; o horário em que melhor podia contar com sossego para esperar em
Deus. Aquela chama da vela significava mais para eles do que tudo que já haviam
lido ou ouvido sobre a oração secreta; significava a realidade, não da
pregação, mas da prática.
A parte mais difícil da
carreira missionária, o Sr. Taylor mesmo verificou, é manter o estudo bíblico
regular, feito com oração. “Satanás sempre há de achar algo para você fazer”,
ele dizia, “quando você devia estar fazendo isto, mesmo que seja só acertar a
cortina de uma janela.” Ele teria endossado inteiramente estas palavras
significativas:
“Tome tempo. Dê tempo a Deus
para se revelar a você. Dê a si mesmo tempo para estar quieto perante ele,
esperando receber, através do Espírito, sua Palavra, para que dela você aprenda
o que Deus lhe pede e o que lhe promete. Que a Palavra crie, à sua volta e no
seu interior, um ambiente santo, uma luz santa celestial, na qual sua alma seja
revigorada e fortalecida para os trabalhos da vida diária.” (André Murray, no
livro “The Secret of Adoration” – O Segredo da Adoração).
Foi justamente por ter feito isso que a vida de Hudson Taylor era plena
de gozo e poder, pela graça de Deus. Quando tinha mais de setenta anos de
idade, parou um dia, com a Bíblia na mão, atravessando a sala em Lausanne, para
dizer a um dos filhos: – Acabo de ler a Bíblia toda, hoje, pela quadragésima
vez em quarenta anos. E ele não só a leu. Viveu-a.
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